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Texto sobre autismo

Gosto muito de ficar "vagando" pelo Facebook, sempre encontro textos interessantes, alguns tão bons que tenho vontade de pedir para cada amigo ler. Esse texto li hoje, agora, deixou-me muito emocionada, pensando em mil coisas, mas principalmente, no amar incondicionalmente, amar infinitamente, cuidar com amor.
Para quem tem perfil no Facebook, segue o link: https://goo.gl/2OBe0s


TELEVISÃO DE BEIJO

Meu amigo Renato Godá tem um filho autista.

É o Tom, 2 anos. Ele não é diferente de niguém. É como deveríamos ser: vulneráveis.

Tom não mente, não engana, não se protege como a gente.

Um menino inteligente ao extremo.

Sua inteligência é sensibilidade. Não descansa um minuto de sentir. De piscar comparações. De fazer operações matemáticas e musicais.

Uma pomba na janela é um terremoto. Um tombo na bicicleta é um colisão de estrelas. Mexer os cabelos é um aplauso.

Não há suavidade disponível para sua absorção. O conhecimento é feito por descobertas chocantes que exigem a mobilização do corpo inteiro.

É como se toda a lembrança fosse sublinhada. É como se toda a observação fosse inesquecível.

Tom me encara de lado, seu ouvido é que me olha.

Ele busca não interromper o ritmo das coisas. Os objetos têm sangue. Os objetos têm porta-retratos. Os objetos têm rosto.

Imagine se você realizasse tarefas escutando seu batimento cardíaco? Este é o autista. om o ouvido de dentro e o ouvido de fora, simultâneos. A porta da sala bate na sala e no coração. O vento assobia na janela e no coração.

Eu amo muito o Tom porque nunca vi um pai como Godá.

Godá é aparentemente desajeitado, boêmio, bagunçado.

Mas se dedica ao filho com uma delicadeza disciplinada que somente existe no interior dos animais selvagens.

Sua paciência é um presépio inesperado no deserto.

Ele explica três, quatro vezes, sem nunca alterar a doçura do timbre.

Sem jamais apresentar irritação pela repetição.

Ainda que esteja compondo ou ocupado com a vida adulta, para a respiração e se põe a conversar. Usa as mãos com gestos lentos de giz.

Toda resposta é nova mesmo que seja antiga.

A atenção pede a mirada firme e cúmplice, com duas colheres de açúcar.

Tom pega o arroz com os dedos. Godá se aproxima e mostra que o garfo é mais divertido do que a mão.

Tom volta a comer com a mão. Godá insiste que o garfo é uma extensão de boneco. Uma luva de robô.

Tom entende por cinco minutos, e Godá rearticula a fábula acrescentando um detalhe a mais de ternura.

Naquela casa, a noite é tarde demais, a biblioteca é longe demais. As histórias estão pousando a qualquer instante.

Tom beija a televisão. Godá diz que a televisão muito perto machuca os olhos. Tom beija de novo a televisão. Godá pede beijo no lugar da televisão.

O pai é um televisor que não prejudica a boca.

Tom ri alto. E beija o pai. Para depois voltar a beijar a televisão.